De um lado, a Igreja nunca cessou
de afirmar a importância do sagrado matrimônio, não apenas em sua esfera
espiritual e sacramental, mas também apregoando suas vantagens para a realização
pessoal do homem e da mulher como família, e como base de transformação de uma
sociedade melhor e mais humana.
De outro, muitos dos que buscaram os
modelos de união oferecidos pelo mundo de hoje, ainda que se sintam angustiados
por não obterem a tão prometida felicidade que outros aparentam ter encontrado
– e cujo conceito não é inteiramente compreendido –, preferem ignorar o pleito
da Igreja, em grande parte por considerá-la "desatualizada" em
relação aos modernos meios de relacionamento possibilitados pela revolução dos
costumes, da informática e da internet.
Todavia, um olhar mais acurado
sobre o tema, lançado por estudiosos não vinculados à Igreja, revela que a
Sagrada Escritura parece não ter perdido em nada a sua atualidade, e que o
ensinamento encontrado em Mateus 7, 14, quando afirma que "é estreita a
porta e o caminho que leva para a vida", apresenta-se como regra de ouro
também para a felicidade nos relacionamentos amorosos.
A Revista Veja, em sua edição de 13
de fevereiro de 2013, faz eco à cobertura mundial dada ao fato de a rede social
Facebook ter entrado de vez, por meio dos serviços "Graph Search" e
do aplicativo "Bang with Friends", no milionário mercado do chamado Online Dating, ou dos encontros
arranjados por meio de websites especializados. A reportagem de Veja fala pouco
do universo dos sites de encontros online que já existe há bons anos e dos seus
algoritmos de afinidade, focando sua abordagem mais no aplicativo "Bang
With Friends", voltado primordialmente para obtenção do chamado "sexo
casual" e não para aproximação de pessoas com intuito de estabelecer
relacionamentos mais sérios; que é o objeto dos sites originais de Online Dating.
Já a edição de fevereiro de 2013 da
revista canadense MACLEAN's – que
traz como manchete de capa a chamada "O
Engodo: encontros online estão se tornando o principal modo como as pessoas se conhecem
e se casam. E isso é mau para o casamento" –, apresenta uma
abordagem bem mais abrangente e bem fundamentada sobre a temática.
Surpreendentemente lúcida e
imparcial para uma publicação não religiosa, ela também dá relevância inicial à
entrada do Facebook no milionário mercado dos encontros arranjados por meio de websites
especializados, trazendo dados nos quais se estima que os 1.500 sites de
encontros hoje existentes valham de 1.5 a 2 bilhões de dólares; que ocorram 542
casamentos por dia nos Estados Unidos entre pessoas que se conheceram por meio
de sites de encontros; e que de cada cinco novos relacionamentos, um se inicie
por meio da internet.
A reportagem canadense segue explanando
sobre como a procura por parceiros na internet se desmistificou e se tornou algo
comum nos últimos 10 anos, a ponto de se poder prever que, num futuro não muito
distante, a prática será tão corriqueira que não se fará mais distinção entre
encontros arranjados de maneira pessoal e aqueles via sites de encontros como o
Match.com e o OkCupid.com. Segundo o jornalista que escreve a reportagem, tais sites não são mais do que uma derivação
daquilo que as velhas senhoras de antigamente – ou os amigos de hoje – faziam e
fazem ao providenciar que solteiros conhecidos seus sejam devidamente
apresentados um ao outro.
Para bem compreender a coisa, é
preciso saber que o sistema tradicional de Online
Dating funciona por meio de determinados algoritmos de computador criados
para comparar as características dos perfis dos diversos usuários e
apresentar-lhes as possíveis "melhores combinações". Na realidade,
alguns desses sites prometem encontrar, por meio de seus algoritmos de busca e
comparação, o "soul mate"
do usuário ou, em bom português, a sua "cara metade".
Em defesa dos sites de encontros,
alega-se que oferecem a possibilidade de pessoas com problemas para iniciar
relacionamentos – como aquelas de idade já avançada ou que possuam uma vida com
características muito particulares – poderem usufruir de uma ferramenta de
pesquisa que lhes aproxime. Há, também, a menção aos casos de pessoas que se conheceram
por meio destes sites e acabaram casando, e se encontram bem e felizes até
hoje. Todavia, essa não é a tônica.
As pesquisas e estudos científicos apresentados
na reportagem comprovam – e os próprios CEOs
dos sites de encontros admitem – que há um outro lado nefasto por trás desse
dinamismo virtual: o aumento no número de divórcios.
Pessoas que fazem uso desses
serviços online mudam seus parâmetros de relacionamento estável em razão da
excessiva oferta de possíveis parceiros tidos como compatíveis, e não se apegam
mais aos relacionamentos existentes, mesmo aqueles iniciados por meio do próprio
Online Dating. A virtual infinidade de
possibilidades apresentada pelos sites – que já possuem até aplicativos para
smartphones, permitindo que se escolha um novo parceiro enquanto se espera o
ônibus – corroem as bases do chamado compromisso afetivo, e desmotivam os
casais a trabalhar os problemas da relação. Fica mais fácil procurar outra
opção compatível do que lutar pelo que se tem.
A opinião de pesquisadores, de
fato, não corrobora a tese de que a compatibilidade de personalidades
apresentada pelos algoritmos de sites de encontros tenha algo a ver com o
sucesso de um relacionamento feliz e duradouro. Segundo os psicólogos Eli Finkel
e Susan Sprecher, a evidência científica atesta que a comparação de
características pessoais por meio de algoritmos de computador é apenas
"desprezivelmente melhor do que conhecer pessoas a esmo".
A pegadinha – ou o
"engodo", como diz a capa da revista – dos sites de encontros reside
no fato de que encontrar alguém compatível mostrou não ter nada a ver com
felicidade.
Há exemplos irônicos e divertidos,
mas que demonstram a trágica incongruência de se buscar sempre novas opções ao
invés de lutar pelo que se tem. O usuário "Mark", um médico de
Toronto duplamente divorciado, ao procurar por um relacionamento melhor online,
se cadastrou no site Match.com e
recebeu e-mails com perfis de parceiras compatíveis. Dentre as possíveis soul mates, havia o perfil de uma de
suas ex-mulheres.
Mais preocupante é o caso de um
homem de 30 anos chamado Jacob, que rompeu seu relacionamento de dois anos com
a – em suas próprias palavras, "bela e jovem" – Rachel, sob a
alegação de que "ter conhecido Rachel tão facilmente pela internet me
tornou confiante de que, se voltasse a ser solteiro, poderia sempre encontrar outra
pessoa". De maneira espantosa, Jacob afirma ainda que, se tivesse
conhecido Rachel fora do universo dos sites de encontros, sem ter tido contato
com aquela ferramenta da internet, ele não teria medido esforços para fazer seu
relacionamento dar certo e para manter Rachel ao seu lado. Porém, as
possibilidades oferecidas online mudaram sua "percepção de
permanência".
Num estudo de 2012, um time de
psicólogos norte-americanos argumentou que pessoas com uma forte crença no
romance guiado pela magia do destino tem tendência de abandonar relacionamentos
amorosos assim que os primeiros problemas aparecem, mesmo quando estão
engajados em relacionamentos recompensadores. Em outras palavras – afirma a
reportagem –, acreditar na cara metade ou no príncipe encantado faz desenvolver
o que os pesquisadores chamam de "disfunção romântica".
Por outro lado, os psicólogos
alegam que "aqueles que acreditam no Crescimento
Romântico (também chamado de Crença
do Faça Funcionar) irão lutar nos momentos difíceis, e terão sucesso".
Corroborando o valor de lutar pelo funcionamento dos relacionamentos amorosos,
o jornalista Dan Slater afirma que "a evidência é sólida no sentido de que
ter um parceiro estável é muito mais saudável e promove o bem-estar".
Numerosos estudos sugerem que pessoas casadas vivem mais do que as solteiras, e
que permanecem mais saudáveis ao longo da velhice.
Lançando outras luzes sobre esse
mesmo ponto, Peter Ludlow, filósofo e professor da Northwestern Univesity, analisa
a problemática apresentada na reportagem e chama a atenção para a necessidade
de valorização dos relacionamentos existentes em detrimento da busca incessante
por novas possibilidades. Diz ele que "se diamantes brotassem de
Dentes-de-leão, ninguém se interessaria por diamantes".
O texto da reportagem encerra dizendo
que, com a difusão dos smartphones e dos aplicativos de sites de
relacionamentos, e à medida em que encontrar um parceiro começa a se assemelhar
cada vez mais a comprar pela internet, algumas pessoas já começam a se preocupar
com "a qualidade dos produtos". O mesmo time de psicólogos acima
mencionado defende, em seu estudo de 2012, que os sites de encontros deveriam
estar sujeitos a regulação e controle externo, da mesma maneira que a indústria
farmacêutica e a de alimentos estão.
Após a leitura, resta nítida a
sensação de que um relacionamento amoroso feliz não depende de encontrar a cara
metade, e muito menos de uma escolha baseada em compatibilidades previamente
auditadas por computador. De fato, a verdadeira compatibilidade parece ser
construída ao longo do relacionamento. Sem querer, a revista canadense acaba fazendo
coro à Igreja no sentido de que a crença num matrimônio sagrado e indissolúvel
– e a luta por ele – torna as pessoas mais felizes do que a opção contrária.
O certo é que a busca pela
felicidade é um pleito lícito. Deus nos quer felizes! Porém, a felicidade e o
amor, dois termos envoltos em altruísmo e generosidade, pressupõe uma caminhada
pela estrada do amadurecimento, e não a busca por atalhos. O uso de meios eletrônicos
que nos indiquem a pessoa "mais adequada", com intuito de se reduzir os
problemas de adaptação, traz em seu escopo um comodismo que soa mais como uma
autoindulgência e, por fim, como puro e simples egoísmo – diametralmente oposto
ao amor e à felicidade verdadeiros.
Pe. Adriano Zandoná, em seu livro
Construindo a Felicidade (Editora Canção Nova, 2012), afirma que "a
felicidade só pode ser concebida por meio de um gradativo processo de
construção, e que ela nunca poderá acontecer instantaneamente e em um repentino
passe de mágica".
Já o Pe. Fábio de Melo, numa de
suas pregações intitulada "Amizade Amadurecida", lembra que "a
psicologia nos ajuda a entender que todo o processo da maturidade vem da nossa
capacidade de sair de nós e de irmos ao encontro do outro". Além disso, a
criança não nasce amando, e sim com o "desejo de possuir o outro",
que é uma espécie de amor não amadurecido e marcado pelo egoísmo. Em suas
palavras, se aprende a amar "quando você descobre que o outro não tem que
ser o que você quer". Só é amor de verdade "quando o outro perdeu toda
a utilidade que ele poderia ter na sua vida, e mesmo assim você continua
olhando nos olhos dele e dizendo: eu não sei viver sem você".
Os estudos mencionados na reportagem
da Revista Maclean's só fazem por confirmar tais ensinamentos. Quanto ao aplicativo
Bang With Friends, ele representa um atalho ainda mais rápido para a
autoindulgência, e não para o encontro do amor e da realização pessoal duradouros.
É quase impossível sustentar alguma ligação entre sexo casual e o encontro da felicidade
verdadeira. Basta se perguntar quão remota é a possibilidade de um parceiro
casual ser a pessoa a segurar nossa mão e velar por nós no leito de um
hospital, ou a caminhar ao nosso lado quando tudo o mais em nossa vida parecer
estar errado.
Em suma, como diz o famoso dito popular
norte-americano: "no pain, no gain".
A porta estreita ainda é a que leva às verdadeiras recompensas!
Pesquisa e Redação:
Departamento de Comunicação – MCJ Ivoti